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Projeto de despoluição do Tietê não traz resultados animadores

23 de setembro de 2015

Artigo de Malu Ribeiro*, originalmente publicado no UOL –  Há cerca de um ano, eu publicava artigo semelhante no portal UOL, relatando que passadas mais de duas décadas do Projeto de Despoluição do Tietê, o maior rio paulista continuava “morto” em um trecho de 71 quilômetros entre os municípios de Guarulhos e Pirapora de Bom Jesus, na região metropolitana de São Paulo, devido a toneladas de esgotos domésticos e industriais que ainda são despejados sem o tratamento adequando neste trecho do rio. Apesar do alerta, meu artigo trazia uma boa notícia, já que tal dado representava uma redução significativa da mancha de poluição do rio, que no início das obras do projeto de despoluição, em 1993, era de 530 quilômetros.

Infelizmente neste ano, os dados do relatório “O Retrato da Qualidade da Água e a Evolução Parcial dos Indicadores de Impacto do Projeto Tietê”, que a Fundação SOS Mata Atlântica produz anualmente para acompanhar a evolução dos indicadores do projeto de despoluição, não são nada animadores. O estudo aponta que, de setembro de 2014 a agosto de 2015, a mancha de poluição e o trecho considerado “morto” do rio Tietê mais que dobrou, passando de 71 quilômetros em 2014 para 154,7 quilômetros em 2015.

Foram realizadas 728 análises da qualidade da água nas bacias hidrográficas do Alto e Médio Tietê, em 109 pontos de coleta distribuídos em 78 corpos d’água, em 26 municípios. Importante destacar que o monitoramento é realizado por grupos de voluntários da SOS Mata Atlântica. Tal recorte abrange a Região Metropolitana de São Paulo e municípios do interior paulista, ao longo do Médio Tietê, em uma extensão de 576 km do rio, de Salesópolis até Barra Bonita.

Antes de entrar nos motivos desse retrocesso, importante abrir um parênteses para detalhar melhor o que é um rio “morto”. Um rio é considerado “morto” quando a carga de poluição orgânica e inorgânica que recebe derruba o oxigênio dissolvido para de zero. Para ter vida, a água precisa ter entre 4 a 10 miligramas de oxigênio por litro.

A qualidade da água dos rios brasileiros segue um padrão de enquadramento definido por uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), com base nos usos preponderantes da água, com padrões que variam entre a classe especial e a classe 4. Apenas os rios de classe especial, de reservas naturais e áreas de manancial, não podem receber nenhum tipo de poluente. A partir daí, até a classe 3, os rios podem receber, após tratamento, despejos de efluentes (esgotos) e suas águas podem ser utilizadas para usos múltiplos . Porém, devido a grande concentração de despejo de efluentes, tratados e irregulares e o baixo volume, a poluição aumenta e os índices de oxigênio na água diminuem, ampliando também a necessidade de tratamento, cada vez mais caro, para o abastecimento humano. Já nos rios de classe 4, a poluição é tamanha que o tratamento para abastecimento público e usos múltiplos se torna inviável. Rios enquadrados na classe 4 têm apenas 2 miligramas de Oxigênio Dissolvido (OD) por litro, portanto, não apresentam condições para abrigar vida aquática e suas águas ficam indisponíveis para usos. Mesmo que não sejam fétidos, só servem para composição de paisagem e diluição de efluentes. Um rio de classe 4 é, portanto, um rio “morto”.

Entendido isto, podemos voltar as causas da “morte” do Tietê por um trecho de 154,7 km. A qualidade da água do rio Tietê é bastante sazonal na região de abrangência do levantamento e é diretamente impactada por variações climáticas e de vazões. Durante o período da análise, o rio passou por drásticas variações de vazão em decorrência da seca severa que afeta a região Sudeste desde 2013. Não bastasse a seca, tempestades atípicas e rápidas que ocorreram na Região Metropolitana de São Paulo e que registraram volumes de chuva acima da média histórica, em especial no dia 27 de novembro de 2014, também influenciaram no aumento da poluição.

Esses episódios resultaram no arrasto de sedimentos acumulados nos reservatórios das barragens ao longo da bacia, com altíssimas concentrações de matéria orgânica em decomposição, metais pesados e bactérias. O lodo arrastado em decorrência da abertura de barragens causou a mortandade de 40 toneladas de peixes, no rio Tietê em Salto, em novembro de 2013, e deixou o rio negro e fétido de Pirapora do Bom Jesus até Botucatu durante 4 dias.

Neste ano, com a repetição da mesma tragédia anunciada, após forte chuva, acima de 77 milímetros na região, que resultou na transferência de água do reservatório de Pirapora, de uma vazão de cheia de 700 metros por segundo para o Médio Tietê, houve a invasão de uma mancha de espuma negra em ruas da cidade de Salto, porém, ainda sem mortandades de peixes, devido a continuidade das chuvas na região por mais dois dias.

Fora esses eventos extremos e a operação inadequada das barragens, o enorme excedente de esgoto sem tratamento dos municípios de Mogi das Cruzes, Suzano, Guarulhos e demais cidades do Alto e Médio Tietê resultaram em impactos diretos na qualidade da água medida em 16 pontos de coleta no rio Tietê e em outros 53 pontos distribuídos nas bacias hidrográficas e que registraram médias de qualidade da água ruim e péssima.

Além das variações climáticas, da operação de barragens e reversão das águas do Tietê por meio do canal do rio Pinheiros para o Reservatório Billings, houve desaceleração na execução de obras de saneamento básico a cargo da Sabesp e do Governo do Estado, por 120 dias, a partir de janeiro de 2015, em razão da crise hídrica. Porém, o pior fator foi a paralisação do projeto Córrego Limpo, que abrange 100 córregos urbanos no município de São Paulo. Esse projeto – que atuou diretamente nas microbacias e o córregos, envolvendo a sociedade local e a Prefeitura – foi responsável, nos dados do ano passado, pelo aumento de índices de qualidade de água boa e regular na área urbana e havia auxiliado na diminuição da mancha de rio morto no rio Tietê.

Os impactos decorrentes do aumento na concentração de poluentes foram percebidos pela população de forma mais intensa no trecho de 157,1 km de extensão do rio Tietê entre os municípios de Mogi das Cruzes, Suzano, Guarulhos, São Paulo – passando pelas Marginais na capital paulista – Osasco, Barueri, Santana de Parnaíba e Pirapora do Bom Jesus até Salto.

Os indicadores levantados ao longo das sucessivas etapas do Projeto Tietê apontam, novamente, que nos períodos de chuvas intensas ocorre o agravamento da condição ambiental do rio no Médio Tietê, por conta da exportação das cargas difusas provenientes da Região Metropolitana de São Paulo e do arrasto de sedimentos contaminados. As cargas difusas são resultado do uso desordenado do solo, do desmatamento em regiões de cabeceira da bacia e mananciais, da falta de coleta de lixo, da poluição de veículos, de agrotóxicos e de despejos clandestinos.

Outra notícia ruim é que devido à redução no ritmo dos investimentos em saneamento básico na Região Metropolitana de São Paulo, não houve registro de melhoria da qualidade da água coletada em nenhum dos pontos analisados. Tal resultado enfatiza que os avanços na recuperação e na condição ambiental de córregos urbanos, registrada em 18 pontos de coleta no ano passado e ausentes neste ano, dependem da ação integrada dos municípios e do Estado – como vinha ocorrendo com o projeto Córrego Limpo – e, sobretudo, da participação efetiva da sociedade e das comunidades locais.

Os resultados obtidos reforçam a necessidade de incluir a gestão integrada e participativa da água na agenda estratégica do país e de aperfeiçoar a legislação no que se refere aos padrões de qualidade da água, acabando com rios de classe 4 na legislação que trata do enquadramento dos corpos d’água.

O enquadramento dos corpos d’água deve indicar uma meta de qualidade da água a ser perseguida para as bacias hidrográficas e não a atual condição ambiental que o rio está. A Fundação SOS Mata Atlântica pede o fim dos rios de classe 4 da Legislação paulista e conclama a sociedade para que o desafio de recuperar rios possa se consolidar em um novo pacto pelo Tietê.

 

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