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Desmatamento não visa melhora da economia, mas sim especulação e expansão ilegal sobre a Mata Atlântica

11 de julho de 2019

Durante audiência pública na última quinta-feira (4), em Brasília, especialistas falam sobre a Lei da Mata Atlântica, seus avanços, ameaças e oportunidades para a garantia da conservação do bioma

A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados realizou na quinta-feira (4) uma audiência pública sobre a Lei da Mata Atlântica. Especialistas como Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, destacaram o histórico de luta pela aprovação da única lei protege um bioma brasileiro – a Lei 11.428 –, pela preservação dessa floresta e quais foram os avanços obtidos até hoje e as ameaças atuais. Vale ressaltar que a Mata Atlântica abriga a maior parte da população brasileira – aproximadamente 145 milhões de pessoas – e está presente em 17 estados.

Para os especialistas, a Lei 11.428 é um dos principais avanços para a preservação da Mata Atlântica brasileira. Uma legislação conciliadora, que garante as atividades humanas, a conservação do bioma e a economia – ao contrário do que setores específicos têm apontado. Por outro lado, do ponto de vista das ameaças, além de ser uma floresta extremamente fragmentada, a Mata Atlântica é um bioma que continua sendo desmatado, especialmente em estados como Minas Gerais, Piauí, Paraná e Bahia.

Alexandre Gaio, promotor de justiça do Ministério Público do Paraná que debateu o tema na audiência, alertou sobre o projeto de Lei 364/2019, do deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), que dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa dos campos de altitude associados ou abrangidos pelo bioma Mata Atlântica. Para Gaio, na prática o PL facilita a supressão dos últimos remanescentes de campos de altitude para atividades agrícolas, passa a desconsiderar os campos de altitude como ecossistema da Mata Atlântica e, o mais grave, institui como de interesse social qualquer atividade agrossilvipastoril nessas áreas.

Segundo o promotor, o argumento por trás deste projeto é que a Lei da Mata Atlântica anula as atividades econômicas nos campos de altitude. Porém, 82% deste ambiente já é utilizado e boa parte dos 18% do que resta preservado também conta com utilização para pecuária extensiva. Isso porque a Lei da Mata Atlântica permite este uso, trazendo algumas condições para tal.

“Este projeto de lei condena à morte espécies que vivem somente naquele local. Além disso, os campos de altitude são indispensáveis para segurança hídrica, pois são as primeiras áreas de estoque de água e drenagem“, destacou o promotor. “Nem o Código Florestal de 2012 permitiu coisas como este projeto quer fazer“, reforçou ele.

Esta situação do Projeto de Lei dos Campos de Altitude é um exemplo de diversos outros, assim como Medidas Provisórias em tramitação, feitas a partir de uma falta de conhecimento sobre a Lei da Mata Atlântica, mesmo mais de uma década após sua aprovação. São iniciativas para flexibilizar uma lei que, ao contrário de impedir atividades econômicas, garante uma melhoria na economia nacional.

“O desmatamento que ocorre na Mata Atlântica não é para promover mais atividades econômicas. Elas são de expansão ilegal. Do ponto de vista legal ela praticamente apaziguou os conflitos de uso. Temos visto muita expansão de propriedades. São grandes áreas, nas mãos de poucos“, afirmou Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica.

O presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP), destacou que existem diversos projetos contra a Mata Atlântica, principalmente ameaças a Unidades de Conservação (UCs) no bioma, como é o caso dos Parques Nacionais de Campos Gerais (PR), São Joaquim (SC), Serra dos Órgãos (RJ), além de propostas para mudanças de categorias de áreas protegidas, como a Área de Proteção Ambiental (APA) Anhatomirim, em Santa Catarina.

“Nós instalamos subcomissões em nosso trabalho para verificar se podemos melhorar esta relação entre a área ambiental com o agro. Não existe caminho diferente para o agro que não seja a sustentabilidade. Se forem para o caminho inverso, terão dificuldade para explorar a produção“, afirmou Rodrigo Agostinho.

Segundo o deputado federal, uma das oportunidades é criar um Programa Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) para quem protege o meio ambiente e que deve ser votado em breve. “As pessoas continuam grilando e cadastrando terras no Brasil, e também na Mata Atlântica. Precisamos valorizar quem protege a floresta“, afirmou ele.

Iniciativas para a Mata Atlântica

Além do PSA, os especialistas destacaram outras iniciativas, muitas delas já existentes em algumas regiões, que podem proteger o meio ambiente e garantir o crescimento econômico.

Para Milene Maia Oberlaender, da Rede de ONGs da Mata Atlântica, um mecanismo é o Fundo de Recuperação e Proteção da Mata Atlântica, instituído pela Lei do bioma, mas que não existe até hoje. Para ela, este fundo poderia auxiliar os municípios na elaboração de seu Plano de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica (PMMA).

“Este plano é muito importante para os municípios inseridos neste bioma. Ele é participativo, traz diversos segmentos da sociedade para o debate, respeita o bioma e traz efeitos positivos para a cidade. Mas, infelizmente, muitas delas não têm condição financeira para fazê-lo. A Mata Atlântica está perdendo diversas oportunidades por conta de atitudes irresponsáveis do atual ministro do Meio Ambiente“, destacou ela.

Para Rodrigo Agostinho, o PMMA é um ótimo exemplo para garantir a conservação da Mata Atlântica, pois se trata de uma política local que garante uma integração entre o Plano Diretor das cidades com a política ambiental. “A maior parte da população brasileira está em municípios da Mata Atlântica. Esta integração entre políticas é fundamental“, finalizou ele.

Para Mario Mantovani, da SOS Mata Atlântica, uma das saídas está na valorização de quem  quem mantém a cobertura florestal em suas terras. Até mesmo alguns municípios têm boas experiências com recursos, como a criação de IPTU Verde. “Não devemos mais ficar apenas falando não. Hoje quem cumpriu a lei está decepcionado, acha que foi penalizado por isso. Precisamos criar incentivos para quem protege. Quem tem propriedade rural hoje não se sente valorizado. Boa parte das alterações propostas para leis ambientais visam flexibilizações e anistias a quem comete crime“, disse ele.

Participação social

Diante deste cenário, os especialistas acreditam que a participação social para a conservação da Mata Atlântica pode ser fundamental para dois aspectos: garantir a transparência de processos de licenciamento ambiental e autorização para supressão da Mata, e para evitar a corrupção em órgãos municipais ambientais que, cada vez mais enfraquecidos, sofrem com a falta de recurso humanos e financeiros.

“É possível evitar a corrupção trabalhando juntos. Governos, sociedade civil e setores econômicos. A informações ambientais são tão dispersas que às vezes o próprio órgão ambiental não tem, por exemplo, se uma área é de abastecimento público, entre outras. É necessária uma sistematização das informações ambientais“, afirmou o procurador da República Leonardo Gonçalves Juzinskas, que ainda ressaltou a situação conflituosa dos estados e municípios com órgãos ambientais federais para a autorização de supressão da Mata Atlântica.

“É preciso que se comece a discutir que os órgãos se ressentem de uma maior regulamentação quanto à fragmentação dos pedidos de supressão da Mata Atlântica. Não raro, há casos de fragmentação para que o empreendedor fuja do limite de três a 50 hectares, de forma fraudulenta, sem que o Ibama tenha ciência“, finalizou ele.

Para Mario Mantovani, é fundamental o fortalecimento dos Conselhos Municipais de Meio Ambiente, uma vez que todo o Sistema de Meio Ambiente (Sisnama) tem sido ameaçado. “Precisamos levar para os conselhos municipais de meio ambiente qual é a relação que a cidade quer ter com as áreas verdes de sua cidade. Qual atividade interessa para sua região?“, ressaltou ele.

Alexandre Gaio ressaltou que o controle social também é crucial nos processos de licenciamento ambiental urbanísticos. Segundo ele, a maior parte das autorizações de supressão são conhecidas depois de aprovadas. O controle e monitoramento preventivo da sociedade na emissão das licenças e aproximação com os órgãos municipais diminuiriam estes riscos.

“No geral, se apenas um artigo da Lei da Mata Atlântica fosse cumprido, seria muito fácil obter as respostas. O artigo 12 da lei, que trata da razoabilidade da supressão, destaca que os novos empreendimentos deverão ser implantados preferencialmente em áreas já substancialmente alteradas ou degradadas. Ou seja, por que avançar em novas áreas se já há quase 90% do bioma em uso?“, questionou ele.

Clique aqui e assista a íntegra da audiência

 Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados 

 

 

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