Artigo de Marcia Hirota e Leandra Gonçalves*, originalmente publicado no Brasil Post – O oceano vem se destacando como uma nova fronteira para o desenvolvimento e crescimento das maiores nações do mundo. Iniciativas ambiciosas como o recente Plano de Ação para o Atlântico, da Comissão Europeia, e o plano chinês para economia marinha são alguns dos exemplos. Sem ir muito longe, podemos destacar as ambições do governo brasileiro em explorar extensivamente as reservas de óleo do pré-sal, ampliar as estruturas portuárias e até mesmo ir ainda mais a fundo solicitando autorização para explorar as riquezas minerais do subsolo marinho da Zona Econômica Exclusiva brasileira.
Novas oportunidades estão surgindo, e não à toa, o governo brasileiro vem trabalhando numa proposta junto à Organização das Nações Unidas para solicitar a ampliação da nossa Zona Econômica Exclusiva de 3,5 para 4,5 milhões de km2.
Os oceanos, que sempre foram vistos como fontes de recursos inesgotáveis continuam, portanto, guiando o imaginário de governos mundo a fora como uma solução para alimentar o planeta e desenvolver nações. No entanto, estamos atravessando limites ainda não conhecidos e com as novas oportunidades surgem também desafios imensos e ameaças preocupantes para esse mar de oportunidades.
Então, como será possível desenvolver economicamente, explorar novas fronteiras tecnológicas e ainda assim manter os oceanos protegidos e saudáveis? A pergunta que valeria um milhão de dólares tem sido discutida em diversos fóruns e em diversos setores.
Em junho deste ano, empresas privadas, governos, ongs e pesquisadores estarão reunidos no World Ocean Summit para debater o que tem sido chamado de ocean economy. Dessa vez, a reunião será em Portugal, mas já foram realizadas edições em Cingapura e nos Estados Unidos. O debate gira em torno de se compreender como desenvolver e explorar a “economia azul”, que implica em continuar explorando economicamente as fronteiras e territórios marinhos, porém de forma sustentável.
Diversos interesses públicos e privados estão em jogo. O oceano está fervilhando de atividades e o risco de sobreposição de interesses é a cada dia maior. Para considerar um desenvolvimento sustentável para a “economia azul” não se pode deixar de lado a necessidade e importância de garantir equidade, geração de emprego e renda, preservação da biodiversidade e a possibilidade de assegurar sustentabilidade dos recursos naturais para as futuras gerações.
Para que as ambições de todos sobre os oceanos não sejam utópicas, é necessário realinhar os interesses dos atores envolvidos nesse jogo: empresas, governos e sociedade. Esta não é uma tarefa para ser realizada individualmente. Governos podem ter um papel fundamental em liderar essa mudança de paradigma, mas ela não será realizada sem a participação do setor privado, e o envolvimento da sociedade civil.
Governos e indústrias têm historicamente utilizado uma abordagem setorial para os oceanos, o que também precisa mudar, já que as atividades e planos devem estar integrados. Pensando separadamente não será possível estimar o impacto conjunto das atividades e muito menos discutir soluções para o combate dessa ausência de coordenação e dessa desgovernança nos oceanos. Assim, se faz necessário uma abordagem integrada para mares e costas buscando considerá-los de forma mais holística e ecossistêmica.
No Brasil, algumas iniciativas já apontam nessa direção. Desde o final de 2013, começou a tramitar no Congresso Nacional o Projeto de Lei 6.969/2013, que institui a Política Nacional para a Conservação e o Uso Sustentável do Bioma Marinho Brasileiro (PNCMar). Também chamada de “Lei do Mar”, o projeto traz elementos essenciais para a promoção do manejo integrado para os mares e zona costeira, como, por exemplo, o planejamento espacial marinho que considera as aptidões naturais das regiões e busca compatibilizar os diversos usos do mar – a exemplo do que vem ocorrendo em outros lugares do mundo.
A iniciativa vem sendo liderada pela sociedade civil, e conta com a participação ativa de parlamentares. Porém, para que seja bem sucedida carece ainda do envolvimento do setor privado: turismo, pesca e exploração mineral. Precisa ainda ser discutido pelos órgãos do Executivo e por novos setores da sociedade. O debate foi iniciado, e agora é a hora de ter maior participação para garantir seu aprimoramento, e representatividade, de norte a sul da costa brasileira.
Com uma das maiores zonas costeiras do mundo, o Brasil precisa ter um projeto de desenvolvimento para o mar. E a sustentabilidade, como um valor, não pode ficar de fora dessa nova forma de se planejar estrategicamente o país.
*Marcia Hirota é diretora-executiva da Fundação SOS Mata Atlântica; Leandra Gonçalves é bióloga e consultora da organização. A SOS Mata Atlântica desenvolve projetos e campanhas em defesa das Florestas, do Mar e da qualidade de vida nas Cidades. Saiba como apoiar as ações da Fundação.