Coletivos de ciência, direitos e meio ambiente se posicionam contra medida provisória que atrasa a restauração e ataca a Lei da Mata Atlântica
2 de maio de 2023Publicada em 25 de abril de 2023 e atualizada em 02 de maio de 2023.
Cresce o número de redes e coletivos que vêm a público se posicionar contra a Medida Provisória 1150, como foi aprovada na Câmara dos Deputados. Pelo menos 300 organizações, entre empresas, ONGs e instituições de ensino já se manifestaram contra o texto. A MP altera pela sexta vez o prazo de adesão ao programa de adequação ambiental previsto no Código Florestal, deixando em suspenso a restauração de mais de 20 milhões de hectares no Brasil, e ainda permite desmatamento de florestas até então intactas na Mata Atlântica, passando por cima da lei especial que protege o bioma.
O grupo de trabalho de meio ambiente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência publicou na segunda, dia 24/04, uma nota que disseca todos os problemas da MP e suas emendas, repudiando o texto. “O texto da MP ameniza a legislação ambiental, contribuindo para favorecer e ampliar o desmatamento. Propõe a postergação de prazos para o cumprimento de instrumentos de implementação do Código Florestal, prejudicando, substancialmente, a restauração florestal”, afirma o GT na carta. De acordo com os cientistas da SBPC, a MP representa um grave retrocesso, “com danos imensos à política ambiental e climática brasileira, com trágicas consequências, especialmente para a manutenção do bem-estar da(o)s brasileira(o)s, economia nacional e o cumprimento dos nossos compromissos internacionais”. “Se a MP for aprovada e sancionada, o Brasil ocupará, mais uma vez, a posição de pária ambiental, pois estará na direção oposta às ações acordadas, em nível global, frente à emergência climática”, declara o documento.
Na análise de Suely Araújo e Nauê Bernardo, especialistas em políticas públicas do Observatório do Clima, as emendas adicionadas à MP no plenário da Câmara são inadmissíveis. Diz o parecer: “Configurando um conjunto de regras especiais, esse conteúdo sequer poderia estar sendo debatido em um processo legislativo voltado a ajustar normas gerais constantes no Código Florestal”.
A opinião é compartilhada pelo Pacto Pela Restauração da Mata Atlântica, rede de mais de 300 organizações que atuam no bioma que é o mais devastado do Brasil. O Pacto defende que o assunto não deveria ser tratado via medida provisória, e sim pelas vias mais democráticas, em ampla discussão com a sociedade. Também reforça que “a proteção jurídica especial da Mata Atlântica decorre da sua previsão constitucional como patrimônio nacional, bem como por se tratar de um dos biomas mais biodiversos e ameaçados do planeta e onde vive a maioria da população brasileira”. Qualquer alteração que comprometa a sua já frágil proteção legal pode representar inadmissível retrocesso ambiental, afirma o Pacto.
Veja como votar contra a MP 1150 na consulta pública no site do Senado.
Para o Observatório do Código Florestal, que também reúne diversas organizações, mesmo o texto sem as tais emendas “jabuti” traz enorme prejuízo à restauração de ecossistemas no Brasil. O coletivo relembra o caminho do Código Florestal até agora e denuncia a falta de implementação da lei, além de mostrar, em dez páginas, que não há necessidade de novos adiamentos e alterações.
Composta por representantes do setor privado, financeiro, academia e sociedade civil, a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura demonstra preocupação com o sinal que a MP dá para desmatadores. “As modificações impostas ao Código Florestal podem sinalizar uma certa condescendência com os produtores rurais que ainda não promoveram a regularização ambiental de seus imóveis rurais. As prorrogações nos prazos legais para implementação do Código Florestal, cuja promulgação completa 11 anos em maio, desmotivam os produtores a se adequarem à lei, atrasando a restauração de áreas vitais para a conservação, como as áreas de preservação permanente”, afirmam em nota.
Além de alterar a Lei da Mata Atlântica, a redação aprovada pelos deputados federais também modifica outra importante legislação ambiental brasileira – a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). A proposta retira a proteção de Unidades de Conservação inseridas em perímetros urbanos em suas zonas de amortecimento, criadas para diminuir o impacto negativo das cidades na natureza. Segundo Angela Kuczach e Douglas Monteiro, que assinam a nota técnica da Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação, “o dispositivo apresenta atecnia e erros grosseiros, e deve ser extirpado do texto final em seu trâmite no Senado Federal”.
A Associação Brasileira Dos Membros Do Ministério Público De Meio Ambiente (ABRAMPA) e a Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente também se posicionaram contra à MP 1150, pela medida atentar contra a proteção do meio ambiente no Brasil.
O texto deve ser votado dentro das próximas semanas no Senado Federal. Caso aprovado, inteiro ou em partes, segue para sanção ou veto do presidente Lula.