Em defesa de um modelo de concessão inclusivo que valorize as comunidades da região
26 de novembro de 2021As Unidades de Conservação na Mata Atlântica resguardam as áreas mais bem preservadas do bioma que já perdeu grande parte de suas formações originais. Em São Paulo, as regiões da Serra do Mar e Vale do Ribeira concentram boa parte da floresta nativa remanescente no estado, que corresponde à apenas 16% da cobertura original da Mata Atlântica paulista.
Dentre as categorias de Unidades de Conservação, os parques são emblemáticos por serem destinados não apenas à preservação da biodiversidade, mas também ao fomento da pesquisa científica e à visitação para fins educativos e de ecoturismo. As experiências vividas na natureza são extremamente relevantes para promover a conexão das pessoas com esse patrimônio, para inspirar a sociedade na defesa da Mata Atlântica e garantir os serviços ambientais.
O uso público nos parques estaduais paulistas faz parte da missão e dos objetivos dessas Unidades de Conservação e a SOS Mata Atlântica defende e valoriza o envolvimento da sociedade com suas áreas naturais e que a participação das comunidades deve ser sempre promovida e estimulada.
Para tanto, as parcerias com os diversos atores sociais são fundamentais. O Estado deve cumprir seu papel de gestor, conduzindo a política pública de forma a zelar pelo bem comum, enquanto atividades de suporte à visitação e uso público, dentre outras, podem ser desenvolvidas em parceria, seja por meio de concessões, autorizações de uso ou outras relações entre Estado, sociedade civil e iniciativa privada, com transparência e participação.
A concessão de serviços de apoio à visitação para atores da iniciativa privada já se mostrou efetiva em diversas experiências no país. Entretanto, é importante defender as possibilidades de concessões em parques e outras Unidades de Conservação com a consciência de que não há um modelo único de concessão e que qualquer forma a ser adotada deve seguir estudos e o Plano de Manejo da unidade, com envolvimento das comunidades locais, da sociedade civil e com transparência.
O Parque Estadual Turístico do Alto do Ribeira (Petar) – onde o uso público é consolidado, com o envolvimento de monitores, empresas locais e ações de turismo de base comunitária, desenvolvidos na região há mais de três décadas – merece atenção especial e muito cuidado.
No planejamento da concessão de áreas no Petar, a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente foi correta ao delimitar e restringir o objeto da concessão à uma área de apenas 0,4% da área total do parque, com foco em três núcleos, excluindo as cavernas das áreas de concessão e deixando claro que a exigência de monitores autônomos para as trilhas não autoguiadas será mantida. Uma concessão pode trazer ganhos reais ao Petar e à conservação da biodiversidade, com investimentos em infraestrutura para pesquisa, valorização das tradições locais, da cultura com maior foco do órgão público na gestão e na proteção desses patrimônios.
Entretanto, para a presente concessão, o processo participativo não foi satisfatório, como demonstrado por meio das fortes reações da sociedade na mídia, em redes sociais, no abaixo-assinado que já reúne mais pessoas do que a população dos municípios abrangidos pelo Petar e por atos e manifestações durante audiência pública realizada na Assembleia Legislativa de São Paulo.
A apresentação de um projeto concebido de forma unilateral pelo Governo do Estado trouxe muita insegurança e dúvidas para as comunidades locais, para empreendedores do turismo e prefeituras da região. A realização de uma consulta pública online não é suficiente, especialmente perante a realidade dessa região que demanda atenção especial das autoridades, no sentido de valorizar a cultura, a participação e o desenvolvimento sustentável.
A sociedade civil reivindica maior transparência, a revisão do atual processo de concessão para que ocorram debates abertos acerca dos estudos de viabilidade, do desenvolvimento dos modelos de edital e contratos, das ações de mitigação para a abertura de novos roteiros e aumento da visitação, entre outros pontos relevantes.
O processo de concessão do Petar demanda um modelo inovador de construção participativa, que seja elaborado fora dos gabinetes, com o justo envolvimento dos atores locais em ciclos de oficinas e encontros para desenvolvimento conjunto e pactuação sobre o futuro da Unidade e o futuro do uso público em seu território.
Sem participação social e engajamento das comunidades locais o propagado Vale do Futuro não se sustenta.