O Programa de Incentivo às Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) da Mata Atlântica, coordenado pelas ONGs Conservação Internacional (CI-Brasil) e Fundação SOS Mata Atlântica, comemora, neste ano, uma década de existência. O projeto foi criado em 2003 para ampliar a área da floresta protegida no País, com a parceria de proprietários de terras particulares. Por meio de editais, o Programa estimula a criação de novas reservas em terras particulares e apoia a gestão de reservas já existentes.
Reservas Particulares (RPPNs) são unidades de conservação criadas pela vontade do proprietário de terras, que decide transformar sua propriedade em uma reserva e assume compromisso com a conservação da natureza. Atividades recreativas, turísticas, de educação e pesquisa são permitidas na reserva e contribuem para sua sustentabilidade e agregam valor ao negócio da propriedade.
Saiba o que é uma RPPN e os principais resultados do programa no vídeo:
Ao longo de 10 anos, o Programa colaborou para o aumento de quase 100% no número de reservas particulares da Mata Atlântica, considerando o número de reservas existentes quando foi lançado, de 422 em 2002.
Com cerca de R$ 6 milhões investidos diretamente em projetos, o Programa apoiou a criação de 392 reservas e a gestão de outras 102, totalizando mais de 57 mil hectares de áreas protegidas, o equivalente a 69 mil campos de futebol. A apresentação desses resultados aconteceu em evento realizado no último dia 29 de outubro, no Auditório da Pinacoteca do Estado, em São Paulo, que reuniu especialistas, realizadores do Programa e alguns dos mais de 300 beneficiados pela iniciativa.
“80% do que resta da Mata Atlântica está em áreas particulares, por isto é imprescindível o engajamento para a proteção dessas áreas. Os proprietários de terra que tomam a decisão de criar reservas devem ser reconhecidos e apoiados, pois os benefícios são para toda a sociedade”, afirmou Mariana Machado, coordenadora Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica, ao apresentar pesquisa de avaliação da iniciativa.
Foi realizado um levantamento para mensurar o alcance do programa, que ouviu técnicos de órgãos ambientais, proprietários, associações e ONGs beneficiadas. A pesquisa constatou que 85% dos proprietários de reservas acreditam que o Programa foi o responsável pela visibilidade e reconhecimento das RPPNs em seus Estados. Além disto, 86% informou que a iniciativa trouxe novas oportunidades pessoais, como capacitações e aprendizados, e 73% indicou que o Programa possibilitou nova alavancagem para sua RPPN.
Outro destaque é que 100% dos órgãos públicos ouvidos consideraram que a iniciativa foi um diferencial na conservação em terras privadas na Mata Atlântica de seus Estados. E ainda, 85% das associações de proprietários de RPPNs avaliaram como ótimo o trabalho do Programa.
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O evento de comemoração contou ainda com uma palestra de Gustavo Fonseca, chefe da Divisão de Recursos Naturais do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), o principal mecanismo financeiro internacional especializado na proteção dos bens comuns do planeta. Fonseca apresentou o cenário nacional e internacional para as reservas particulares e informou porque o GEF investe em unidades de conservação em todo o mundo. Segundo ele, as tendências mundiais de uso da terra e o crescimento populacional oferecem uma contagem regressiva à biodiversidade, que gera diversos outros impactos em cadeia.
“Estamos condenados a um planeta 4ºC mais quente. As espécies invasoras, a extinção de espécies e a poluição são algumas das causas da perda de biodiversidade no mundo, mas a principal delas é a perda de hábitat gerada pelo desmatamento”, afirmou.
Diante desse dado, o GEF investe atualmente cerca de US$ 2,3 bilhões para preservar a biodiversidade no mundo. Os investimentos já ajudaram a proteger mais de 7 milhões de km2, ou 30% do sistema global de áreas protegidas, que conta com 24 milhões de km2, extensão maior do que a Rússia.
Ao apresentar mapas e dados de desmatamento no Brasil, Fonseca observou que “fica nítido que as áreas que estancaram os focos de desmatamento e não os deixaram avançar são áreas protegidas, como Terras Indígenas e outras reservas públicas ou particulares”.
“Ainda há uma série de dificuldades técnicas para que as RPPNs sejam reconhecidas nos bancos de dados mundiais de áreas protegidas. No entanto, não se pode negar que os investimentos feitos pelo Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica foram muito importantes para o cenário da conservação em terras privadas nacional. Existem espécies que encontram nessas reservas particulares o caminho para a sua migração. Sem essas reservas, seria impossível proteger áreas tão importantes. Temos de engajar associações, governos, sociedade civil e o setor privado nessa história”, concluiu.
Proprietários do futuro
“Como proprietários de reservas particulares, recebemos muito em troca. São valores intangíveis –como imagens que remetem à infância, a observação dos pássaros, a tranquilidade e a paz interior”. Foi com essa afirmação que a jornalista Miriam Leitão, proprietária de RPPN, iniciou o seu discurso numa mesa redonda que fechou o evento de comemoração dos 10 anos do Programa. Participaram também da conversa Sérgio Abranches, analista político, comentarista da Rádio CBN, cientista político e sociólogo; Gustavo Fonseca, do GEF, e Beto Mesquita, diretor do Programa Mata Atlântica da CI-Brasil.
Entre os aspectos mais abordados durante a mesa estavam os incentivos econômicos existentes para quem preserva a floresta, como o ICMS Ecológico e os sistemas de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), entre outras políticas públicas.
Para dar um bom exemplo de iniciativa nesse sentido, foi apresentada a conquista de seis proprietários de terra do município de Varre-Sai (RJ), que no último dia 26 de outubro foram beneficiados com um repasse de R$ 14.909,73 de recursos do ICMS Ecológico da Prefeitura local.
O Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica apoiou a criação da primeira reserva do município, aprovada no edital 7/2009. A partir dessa reserva, outras foram reconhecidas pelo órgão ambiental do Estado, o INEA– (Instituto Estadual do Ambiente). Em 2010, após mobilização do prefeito e secretário de meio ambiente, foi aprovada a lei municipal que reconhece RPPNs e a lei municipal de repasse do ICMS Verde aos proprietários de RPPN. A regulamentação prevê que 60% do valor recebido pelo município pela área protegida por RPPNs será repassado aos proprietários destas reservas.
“Alguém disse que quem trabalha com RPPN é sonhador. Somos sim, mas realizamos nossos sonhos. Sonhar é possível e realizar também é”, ressaltou Deise Moreira Paulo, proprietária de RPPN e diretora executiva da Associação de Proprietários de RPPN do Rio de Janeiro (APN), organização responsável pelo convênio com a prefeitura para os repasses.
Raio-X do Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica