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SOS Mata Atlântica faz análise dos 100 primeiros dias de governo federal para a área socioambiental

16 de abril de 2019

O governo Bolsonaro completa 100 dias sem nenhum avanço e com alguns retrocessos na agenda socioambiental. Avaliação da Fundação SOS Mata Atlântica aponta que, desde que assumiu, Jair Bolsonaro promulgou medidas que têm acarretado o desmonte das estruturas de participação da sociedade e comprometido a implementação de políticas públicas ambientais, o que deve prejudicar, por exemplo, as metas assumidas pelo Brasil para 2030 no Acordo de Paris.

Há um grave enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente, que quase foi extinto e sofre com uma sangria de recursos humanos, financeiros e políticos, além da perda da Agência Nacional de Água (ANA) e do Serviço Florestal Brasileiro (SFB). E agendas positivas, como o mecanismo de conversão de multas em serviços ambientais, estão ameaçadas.

Veja abaixo a análise completa da ONG, dividida pelas causas nas quais atua:

Análise dos 100 primeiros dias de governo federal

Na análise feita pela SOS Mata Atlântica dos programas eleitorais dos candidatos à Presidência da República registrados na Justiça Eleitoral em 2018, o conjunto mais vazio de proposições para a área ambiental era o de Jair Bolsonaro (PSL). E, assim que assumiu, promulgou medidas que vêm acarretando o desmonte das estruturas de participação da sociedade, tem comprometido a implementação de políticas públicas ambientais e que devem prejudicar as metas assumidas pelo Brasil para 2030.

A medida provisória que trata da reforma administrativa (MP 870) concentrou poderes na Presidência da República e Casa Civil e dilapidou o organograma dos órgãos ambientais federais. Além disso, veio seguida de uma proposta da Casa Civil, que se tornou pública, para esvaziamento dos órgãos ambientais de caráter participativo. Em ofício ao Ministério do Meio Ambiente, é recomendada a extinção, adequação e fusão de tradicionais colegiados, assim como em suas atribuições, como o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).  

Nenhuma dessas ações teve fundamentação técnica e explicação quanto aos impactos que trarão ao atendimento do Artigo 225 da Constituição Federal – que prevê que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

Nesta linha, ocorre o enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente, que quase foi extinto e sofre com uma sangria de recursos humanos, financeiros e políticos, além da perda da Agência Nacional de Água (ANA) e do Serviço Florestal Brasileiro (SFB).

Estão em desenho atos para desarticular o mecanismo de conversão de multas, que inicialmente investiria recursos na recuperação das bacias hidrográficas dos rios São Francisco e Parnaíba; para flexibilizar o Decreto 6.514/2008, que trata das “infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências”. O enfraquecimento dos órgãos de fiscalização e controle, a flexibilização na aplicação de sanções administrativas e nas multas por danos ambientais enfraquecem o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA).

E, por fim, o licenciamento ambiental, alvo de propostas de flexibilização e pressões, tramita no Congresso Nacional sem atenção estratégica do governo brasileiro, que tende a seguir modelo internacional controverso, que desconsidera a importância do meio ambiente para uma agenda estratégica de desenvolvimento para o Brasil.        

1 – Mata Atlântica

A desestruturação do SISNAMA agrava as ameaças à Mata Atlântica, em especial ao que se refere à anuência para supressão de vegetação nativa. Ao enfraquecer o Ibama e repassar competências sobre a conservação, proteção e usos do bioma Mata Atlântica para outros órgãos, o governo federal põe em risco o patrimônio nacional e a qualidade de vida de 145 milhões de brasileiros que vivem no domínio dessa floresta.

2 – Restauração da Floresta

A Comissão Nacional para Recuperação Nativa (Conaveg) não foi implementada, comprometendo o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), desenhado para recuperar 12 milhões de hectares de vegetação nativa no país – cerca da metade do passivo verificado com a edição do chamado Novo Código Florestal (Lei 12.651/2012).

Outra agenda prejudicada é a da restauração de vegetação nativa associada ao mecanismo de conversão de multas proposto pelo Ibama. A ideia era oferecer descontos no pagamento de infrações cometidas, especialmente as de grande valor, para aumentar os índices de adimplência (historicamente entre 3% e 5%) e, ao mesmo tempo, promover a recuperação de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e outras áreas, inicialmente nas bacias dos rios São Francisco e Parnaíba.

O Serviço Florestal Brasileiro (SFB), incluindo o Laboratório de Produtos Florestais, foi movido para o Ministério da Agricultura. Até o fim de 2018, vigorou parceria técnica entre Fundação SOS Mata Atlântica e SFB para uso da base de dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR) voltado ao desenvolvimento de análises e de sugestões de políticas públicas para o bioma, estudo este está em andamento e gostaríamos que fosse concluído.

3 – Valorização dos Parques e Reservas

Embora o tema das Unidades de Conservação (UCs) tenha aparecido com frequência no plano de metas para os 100 dias do governo, não houve, explicitamente, medidas destinadas a fortalecer a agenda de implementação e fortalecimento do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, um conjunto de áreas protegidas importantíssimas e estratégicas para um país megadiverso como o Brasil.

A possível junção entre IBAMA e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) tem sido apontada como caminho, mas não há clareza quanto ao projeto de gestão proposto para o conjunto das áreas. Dois processos de concessão de serviços em UCs foram colocados em operação, em parques importantes e estratégicos – o que é positivo – e um novo edital colocado à disposição do mercado. No entanto, os avanços estão sendo feitos sem a devida atualização do plano de manejo da unidade, documento importante para orientar as parceiras e a visitação.

O Fundo de Compensação Ambiental, que tem potencial para alavancar a implementação das UCs, com a regularização fundiária das áreas, até o presente não foi colocado em operação.

4 – Água Limpa

A fragmentação da gestão da água, com a transferência da Agência Nacional de Águas do Ministério do Meio Ambiente para o Ministério do Desenvolvimento Regional, impacta e deixa lacunas no Sistema Nacional de Recursos Hídricos – que têm como preceito fundamental a gestão integrada, descentralizada e participativa. Ao tratar a água desassociada do meio ambiente, o Brasil limita a gestão desse bem de interesse público estratégico à vida – cujo acesso é Direito Humano – aos usos voltados ao desenvolvimento econômico, desconsiderando o valor mais amplo da água para a manutenção da vida humana e dos ecossistemas naturais.

A qualidade da água dos rios brasileiros reflete os impactos da falta de integração entre as políticas públicas de meio ambiente e uso do solo e, principalmente, da flexibilização do Licenciamento Ambiental, da Política Nacional de Resíduos Sólidos, do uso de agrotóxicos e dos precários índices de saneamento básico no país. E, até o momento, apesar de apontada como uma questão prioritária, a única iniciativa para avanços no saneamento está em discussão no Congresso Nacional, por meio da Medida Provisória 868/2018, que altera o Marco Legal do Saneamento Básico e amplia as competências da  Agência Nacional de Águas (ANA) para que passe a editar normas sobre os serviços de saneamento, hoje uma atribuição dos municípios e das Regiões Metropolitanas (via consórcios).

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), órgão superior da Política Nacional de Recursos Hídricos, até o momento não se reuniu, seja para debater as mudanças administrativas que afetam a gestão da água no Brasil, ou os compromissos e metas assumidos pelo país para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Nem mesmo no Dia Internacional da Água (22 de março), o governo brasileiro apresentou estratégias ou plano de ação para a gestão de recursos hídricos no novo desenho administrativo, fato que acarreta insegurança e incertezas ao setor.

5 – Proteção do Mar

O único fato positivo ocorrido nessa agenda foi o lançamento do Plano de Combate ao Lixo no Mar. A ideia era gestada desde 2007, mas sua construção, que foi atropelada para lançamento oficial, está loteada de propostas e ações sem coesão e sem orçamento garantido.

Recentemente, o presidente do Ibama rejeitou análise técnica e autorizou leilão de blocos de petróleo, colocando em risco ecossistemas importantes na região da Bahia e do Espírito Santo, assim como o Complexo de Abrolhos.

Nesse tema, é urgente a implementação e operacionalização do Plano Nacional de Contingência pelo Ministério do Meio Ambiente, de forma a garantir a segurança ambiental nas principais e mais ricas zonas costeiras do mundo, assegurando a prevenção, preparação e capacitação de resposta nacional a incidentes de poluição e acidentes diante de um importante empreendimento de alto risco, que é a exploração de petróleo.

Fundação SOS Mata Atlântica

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