Artigo por Pedro Passos*, originalmente publicado na Folha de S.Paulo – Na mesma Paris golpeada pelos ataques terroristas de um mês atrás, ministros de 195 países mostraram que a civilização é capaz de vencer a barbárie, ao consagrarem, no fim de semana passado, o mais promissor acordo mundial contra o aquecimento global e os flagelos climáticos decorrentes, se não reduzidas as emissões de poluentes.
O que começou como movimento de ambientalistas e cientistas, vistos como alarmistas décadas atrás, terminou com um “pacto pelo ar limpo” de todos os governos —da China e dos EUA, maiores emissores dos gases responsáveis pelo aumento da temperatura da Terra (o CO2, entre outros), aos pequenos países-ilhas, condenados a desaparecer submersos, caso continue a elevação do nível do mar.
A COP-21 resultou num avanço notável num mundo de antagonismos políticos, religiosos e econômicos, demonstrando (por exemplo, ao governo e aos políticos em Brasília nestes tempos de impasse econômico e político) que pode haver comunhão entre adversários em torno do bem comum.
O pacto para limitar até 2030 o aumento da temperatura global a 2ºC sobre a média da era pré-industrial, com 1,5ºC como meta tentativa, não resolve o aquecimento no mundo por si. Mas o consenso de que os fenômenos climáticos representam risco real à vida foi animador.
Esse acordo foi inédito —e teve a participação ativa da delegação brasileira, como o presidente Barack Obama reconheceu em telefonema de agradecimento a Dilma Rousseff. Foi outra demonstração do potencial desperdiçado pela nossa diplomacia para atuarmos de forma positiva em fóruns internacionais.
Por que não fazer uso dessa capacidade negociadora para relançarmos a presença brasileira no cenário internacional, participando da elaboração dos mega-acordos comerciais que determinarão os padrões de comércio, aos quais nosso país será obrigado a aderir sem ressalvas, a não ser que assuma maior protagonismo nas negociações?
Os bastidores da COP-21 também foram agitados pela pressão de empresas e bancos para os governos explicitarem as diretrizes da economia com baixo carbono. Isso é essencial para o ordenamento regulatório daqui em diante e para sinalizar ao capital onde não mais investir.
Isso aconteceu, embora sem a clareza pedida pelos ambientalistas. O texto final do acordo excluiu a meta mandatória do carbono zero, por demanda da Arábia Saudita. Talvez ressurja nos próximos encontros.
Na prática, tal tendência ganha força nos Estados Unidos e na Europa, vista pelo colapso do valor de mercado das mineradoras de carvão, além do abandono da exploração de petróleo no Ártico. É também relevante o pacto de vários grupos empresariais no sentido de anunciar prazo para que deixem de se servir de energias fósseis.
Fica duvidoso, nesse cenário, que o pré-sal possa ir mais longe do que já existe. O desenvolvimento no Brasil deve prever dois eixos estratégicos: energias renováveis e eficiência energética.
É outro modo de produção que desponta. Há muito a ser feito. Cada país apresentará um plano de ação que será acompanhado globalmente. Privilegiado por suas condições naturais, o Brasil tem aí uma grande oportunidade para se lançar com determinação e competência em um novo ciclo de desenvolvimento para a agricultura, a indústria extrativa, a manufatura e o setor de serviços, sempre orientado pela ciência, tecnologia e inovação.
A mudança é inexorável. Mas, em vez de se dedicarem a ela, nossos políticos, enredados pelas mazelas da corrupção, agem para salvar a própria pele, fazendo de Brasília o palco do inferno, só descrito com mais talento na “Divina Comédia”, de Dante Alighieri. E o clima do planeta? Ora, deixa isso para depois…
*Pedro Luiz Passos, empresário, é presidente da Fundação SOS Mata Atlântica.
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