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Perda de florestas mais antigas é ameaça à Mata Atlântica

Artigo de pesquisadores brasileiros na revista Science Advances faz alerta sobre a preocupante dinâmica de desmatamento de florestas nativas maduras e aponta desafios para programas de restauração

21 de janeiro de 2021

Artigo publicado por especialistas brasileiros na renomada revista Science Advances mostra que a aparente estabilidade da cobertura florestal nativa na Mata Atlântica desde 2000 esconde uma forte e preocupante dinâmica de perda de floresta natural madura, especialmente em algumas regiões do bioma, o que impacta a sobrevivência de espécies e o fornecimento de serviços ecossistêmicos, como a mitigação das mudanças climáticas.

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O grupo – liderado por Marcos Reis Rosa, doutorando na área de Geografia na USP e coordenador técnico do MapBiomas – aponta que, desde 2005, o ganho de floresta natural é superior ao desmatamento. Porém, o desmatamento de floresta madura, mesmo em queda, ainda tem valores muito alarmantes.

“Foi demonstrada a recuperação de florestas jovens, que são essenciais para aumentar a cobertura florestal e criar corredores entre fragmentos isolados, principalmente em Áreas de Preservação Permanente ao longo dos rios. Mas o estudo também comprova o desmatamento contínuo das florestas nativas mais antigas, com maior biodiversidade e carbono estocado, principalmente para ampliação da agricultura e plantio de florestas exóticas. Apesar dessa dinâmica de perda e ganho de florestas nativas ter mantido a quantidade de floresta praticamente estável nos últimos 20 anos, esse rejuvenescimento das florestas pode ser extremamente danoso para a conservação do bioma”, ressalta Rosa.

Ele afirma ainda que, “na atual década da restauração de ecossistemas instituída pela ONU, é necessário ampliar as ações de restauração da floresta nativa, porém é imprescindível buscar o desmatamento zero e manter todos os instrumentos e iniciativas de proteção dos remanescentes florestais existentes”.

Para o ecólogo Jean Paul Metzger, do departamento de Ecologia da USP e que também colaborou com o artigo, “a estabilidade na cobertura de Mata Atlântica passa a falsa impressão que o desmatamento está controlado”. “Infelizmente, não está. A análise separada das taxas de desmatamento e de regeneração mostra que o desmatamento no bioma ainda é significativo e afeta matas maduras, que são as matas mais importantes para conservação da biodiversidade e para a regulação climática e hídrica”, reforça o pesquisador.

Florestas maduras são insubstituíveis para a conservação da biodiversidade tropical, conclui o estudo – já que muitas espécies de animais, plantas e microrganismos são incapazes de recolonizar florestas secundárias e dependem de habitats mais antigos, menos alterados, estruturalmente mais desenvolvidos e biodiversos para persistir.

O artigo indica ainda que a dinâmica de ganho e perda de floresta nativa tem uma forte relação regional. A perda de floresta nativa se concentra na região centro-sul do Paraná e Santa Catarina, especialmente nas Matas de Araucárias, e na divisa entre Minas Gerais e Bahia, principalmente na região das Matas Secas. Já o ganho de floresta nativa é observado no interior do Paraná e de São Paulo, no sul de Minas Gerais e do Espírito Santo, além da região Serrana do Rio de Janeiro e litoral de Pernambuco e Paraíba.

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O estudo afirma que a suposta estabilidade na cobertura florestal nativa ocorre, pois florestas maduras que continuam sendo desmatadas estão sendo substituídas por florestas jovens, em recuperação. Foi notada praticamente a mesma quantidade de floresta recuperada e de florestas maduras desmatadas.

Para Marcia Hirota, diretora executiva da Fundação SOS Mata Atlântica, grande parte desse desmatamento poderia ter sido evitado pela aplicação da Lei da Mata Atlântica, aprovada em 2006. O bioma foi o primeiro no país a contar com uma lei específica, que funciona como uma camada especial de proteção que precisa ser respeitada para que ele continue vivo. “A lei é importante não só para a floresta, mas também para a qualidade de vida da população, já que 72% dos brasileiros vivem em áreas de Mata Atlântica e são beneficiados por ela, com serviços como a regulação do clima, abastecimento de água e turismo“, afirma ela.

Marcia reforça a importância de criar novas Unidades de Conservação, como parques e reservas públicos ou privados, para preservar as florestas maduras. E cabe ainda aos municípios elaborar o Plano Municipal da Mata Atlântica (PMMA), com diretrizes e um plano de ação voltado para projetos de recuperação, pesquisa científica e uso sustentável em remanescentes da floresta atlântica. De acordo com a lei, o PMMA deve ser aprovado pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente antes de ser colocado em prática.

Retrocesso

De acordo com o artigo, 11% da cobertura florestal de Mata Atlântica atual são florestas jovens, com menos de 20 anos. Para os pesquisadores, o rejuvenescimento da cobertura florestal nativa representa um retrocesso crítico.

“Uma mensagem fundamental desse artigo é que a manutenção da estabilidade da cobertura florestal, ou até um ganho líquido de floresta, nos últimos anos, parece ser uma notícia boa que deve ser comemorada, mas ainda sim mascara grandes riscos. A recuperação da vegetação nativa deve se dar não apenas em quantidade, mas também em qualidade. Trocar floresta madura por florestas jovens é um risco para a biodiversidade e mitigação das mudanças climáticas. A recuperação florestal tem que acontecer, especialmente em biomas extremamente desmatados e fragmentados como a Mata Atlântica. Mas essa recuperação florestal tem que vir atrelada à manutenção das florestas maduras. Ou seja, nem sempre a transição florestal, ganho líquido de floresta, é um sinal de melhoria da qualidade ambiental”, afirma Renato Crouzeilles, diretor do Instituto Internacional para Sustentabilidade na Austrália, que também assina o artigo.

No Bonn Challenge, esforço global para restauração florestal, quase 200 milhões de hectares de compromissos de restauração florestal foram prometidos por mais de 60 programas nacionais e subnacionais, a maioria deles localizados em países tropicais em desenvolvimento. “A perda não computada da cobertura florestal nativa madura durante a implementação de programas de restauração nos trópicos globais pode ser ainda pior do que o que observamos na Mata Atlântica, visto que o Brasil é (ou pelo menos foi) globalmente reconhecido por suas políticas e ferramentas de sucesso para reduzir o desmatamento”, afirma Pedro Brancalion, do Departamento de Ciências Florestais da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP.

Crédito: Fundação SOS Mata Atlântica

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