A Mata Atlântica abrange cerca de 15% do território nacional, em 17 estados. É o lar de 72% dos brasileiros e concentra 80% do PIB nacional. Dela dependem serviços e atividades essenciais como abastecimento de água, regulação do clima, agricultura, pesca, energia elétrica e turismo. Hoje, resta muito pouco da floresta que existia originalmente. É preciso monitorar e recuperar a floresta, além de fortalecer a legislação que a protege.
A Mata Atlântica já perdeu quase 90% de sua área original e agora precisa ser recuperada, para proteger espécies, serviços ambientais e evitar a falta d’água. As iniciativas de Restauração Florestal da Fundação estão entre as que mais contribuíram para reabilitar a floresta no país, com mais de 42 milhões de árvores nativas plantadas.
As Unidades de Conservação (UCs), mais conhecidas como parques e reservas, são protegidas por lei para resguardar o patrimônio natural e sociocultural. A Fundação já contabiliza o apoio a mais de 500 UCs em áreas de floresta, de costa e de mar, com investimento de R$ 15 milhões.
35 milhões de brasileiros não têm acesso à água limpa, 46% do esgoto no Brasil é tratado e mais de 60% das doenças que levam a internações no SUS decorrem da água contaminada. Por meio de projetos, campanhas e outras iniciativas, a Fundação monitora a qualidade da água com a ajuda de voluntários e busca o fortalecimento das leis que protegem nossos rios.
Os incêndios no Pantanal e em matas do Brasil fazem parte de um novo ciclo de devastação da vegetação nativa. Os seus combustíveis têm sido as ações do governo brasileiro, desmontando o Sistema Nacional de Meio Ambiente, construído com muito empenho pelo Estado brasileiro.
A diminuição da fiscalização ambiental e o enfraquecimento de políticas regulatórias, como o Código Florestal e das áreas protegidas, são os principais sintomas desta estratégia. No campo, os atores são grileiros e fazendeiros irresponsáveis. A disputa é por terra e poder. O pano de fundo: a visão da natureza e de seus povos como barreira ao crescimento econômico. Um almoxarifado de curto prazo.
Uma visão tacanha que somente pode estar apoiada em outra marca dos nossos atuais líderes de Brasília: a negação da ciência e a ignorância a respeito da centralidade da natureza para a prosperidade da humanidade. O ceticismo da urgência de enfrentar as mudanças climáticas.
Este trágico quadro nos faz lembrar da magnífica obra do historiador Warren Dean de 1995: A ferro e fogo – a história e a devastação da Mata Atlântica Brasileira. Infelizmente a história da Mata Atlântica se repete pelo país.
Warren nos mostra que, da chegada de Cabral em 1500 à metade do século 20, os ciclos do pau-brasil, cana-de-açúcar, ouro e café se basearam no casamento do desmatamento com a escravidão e a violenta ocupação de terras públicas por uma pequena elite que viveu em simbiose com as canetas do poder. Ele aponta que a destruição da Mata atlântica foi feita sem a menor curiosidade pelo seu valor ecológico e econômico, escravizando seus povos e ignorando o seu conhecimento e a sua cultura.
A visão imediatista resultava no desmatamento à base do fogo e do ferro dos machados para uma produção voltada à exportação. A exaustão das terras em pouco tempo vinha acompanhada de decadência, deixando um rastro de destruição e pobreza para a população nativa e mestiça, que ficava com o papel de produzir alimentos de maneira precária para os brasileiros nas terras exauridas e sem o apoio do Estado.
Novas terras eram dadas para a elite seguir derrubando matas e repetindo o ciclo devastador indefinidamente. As terras eram dadas aos ricos enquanto a situação fundiária dos pobres agricultores não era resolvida e as regras ambientais, presentes desde a colônia, desrespeitadas impunemente pela elite. Das capitânias hereditárias de 1500 à escandalosa ocupação do Pontal do Paranapanema em São Paulo, em plena metade do século 20, a história é a mesma.
O Brasil e a sua agricultura se modernizaram rapidamente e muita coisa mudou nas últimas décadas, mas a marca da história da Mata Atlântica continua impregnada nas canetas do poder Executivo e do Congresso Nacional, nos trazendo de volta aos períodos de ferro e fogo de Warren para todos os cantos do Brasil.
Com o desmonte federal, os atuais governos estaduais e os futuros municipais têm a oportunidade e a responsabilidade de se alinharem para liderar a agenda de conservação e desenvolvimento e garantir o futuro do Brasil. A recuperação dos 7 milhões de hectares de florestas de Mata Atlântica para cumprir com o Código Florestal é um primeiro passo.
Mario Mantovani e Luís Fernando Guedes Pinto são diretores, respectivamente, de Políticas Públicas e de Conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica.
Crédito: Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo em 15/12/2020
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